Lei Maria da Penha completa 18 anos de luta pelo fim da violência contra a mulher

Considerada uma das legislações mais avançadas no mundo pela Organização das Nações Unidas (ONU), a Lei Maria da Penha (n° 11.340/2006) completa agora, em agosto de 2024, 18 anos. A norma trouxe inovações como medidas protetivas de urgência e a criação de equipamentos de proteção às vítimas. 

A Lei Maria da Penha trata sobre questões que envolvem violência doméstica, seja ela física, moral, psicológica, sexual ou patrimonial. Antes da Lei, estes tipos de violência eram considerados de menor potencial ofensivo. Não havia dispositivo legal para punir com mais rigor os autores de violência, que tinham penas reduzidas a prestações de serviço à comunidade, como pagamento de cestas básicas ou trabalhos comunitários.

Atualmente, a legislação assegura vários  direitos às vítimas, dentre eles a própria definição de violência doméstica e familiar – caracterizando suas diversas formas de manifestação - física, psicológica, sexual, patrimonial e moral. A Lei tipifica tais violências como crime, proibindo a aplicação de penas pecuniárias aos agressores e ampliando a pena de um para até três anos de prisão, além de criar mecanismos de proteção às vítimas.

Apesar dos avanços ao longo do tempo, o Brasil ainda tem um longo caminho a percorrer no combate à violência doméstica e familiar. Dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2024, mostram o crescimento da notificação dos casos em todos os tipos de violência contra mulheres no Brasil em 2023, incluindo ameaça, stalking (perseguição), agressões físicas em contexto de violência doméstica, violência psicológica, estupro, feminicídio e tentativa de feminicídio. 

Segundo o levantamento, 1.467 mulheres foram vítimas de feminicídio em 2023 – ou seja, em média, quatro mulheres morreram por dia vítimas desse crime. Dessas, 63,6% eram negras, 71,1% tinham entre 18 e 44 anos, e 64,3% foram mortas em casa. O assassino foi o parceiro em 63% dos casos, o ex-parceiro em 21,2% e um familiar em 8,7% dos registros. 

No Distrito Federal, o governo tem divulgado relatórios que tratam sobre os casos de feminicídio e de violência contra a mulher. De acordo com os dados apresentados pela Secretaria de Segurança Pública do DF, em comparação ao mesmo período de 2023, houve um aumento de 4,5% nos crimes de violência doméstica no primeiro semestre de 2024, com 9.795 ocorrências registradas. No ano passado, foram computados 9.370 casos. As regiões administrativas que registraram os maiores índices desse tipo de crime nos primeiros meses deste ano foram Ceilândia (1360 casos), Samambaia (797) e Planaltina (784). O Lago Sul foi o local em que houve o maior aumento (77%) de ocorrências, quando comparado ao primeiro semestre de 2023, saltando de 26 para 46 registros. 

Mesmo com mais notificações e com a divulgação sobre a legislação, a 10ª Pesquisa Nacional de Violência contra a Mulher, apresenta  que menos de um quarto das brasileiras (24%) afirma conhecer muito sobre a Lei Maria da Penha. Esse índice é maior no Distrito Federal (33%), e menor no Piauí (17%), Maranhão (17%), Amazonas (17%), Paraíba (19%) e Pará (19%). Esta pesquisa é realizada pelo Instituto DataSenado em parceria com o Observatório da Mulher contra a Violência (OMV). 

A pesquisa mostra ainda que cerca de metade das brasileiras acredita que a Lei Maria da Penha protege apenas em parte as mulheres contra a violência doméstica e familiar (51%), patamar semelhante ao das unidades federativas do país.

Ainda há um longo caminho para tornar a legislação mais eficaz e aplicável, além de disseminada por toda a sociedade. Para tentar garantir que isso aconteça, o Congresso já incluiu ou modificou 50 dispositivos da Lei Maria da Penha, por meio de 15 novas normas sancionadas entre 2017 e 2024. As modificações aprimoraram a legislação, como, por exemplo, ao reconhecer e punir o crime de perseguição (Lei 14.132/21).

Atualmente, 324 projetos de lei em tramitação na Câmara dos Deputados podem fazer novas mudanças na Lei Maria da Penha. Destes, 89 foram apresentados nesta legislatura por 61 parlamentares.

Confira abaixo as mudanças já realizadas nesses últimos anos. 

Lei 13.505/2017 (PL 36/2015) - Define procedimentos do atendimento policial e pericial especializado nos casos de violência contra a mulher.

Lei 13.641/2018 (PL 173/2015) - Torna crime o descumprimento das medidas protetivas previstas na Lei Maria da Penha.

Lei 13.772/2018 (PL 5555/2013) - Tipifica uma nova forma de violência contra a mulher, a violação de sua intimidade.

Lei 13.827/2019 (PL 6433/2013) - Autoriza delegados e policiais a decidirem, em caráter emergencial, sobre medidas protetivas para mulheres.

Lei 13.836/2019 (PL 347/2015) - Obriga informações sobre a condição de deficiência da vítima nos boletins de ocorrência.

Lei 13.871/2019 (PL 2438/2019) - Exige que agressor pague os custos dos serviços prestados pelo Sistema Único de Saúde e dos dispositivos de segurança.

Lei 13.880/2019 (PL 17/2019) - Permite ao juiz ordenar a apreensão de arma de fogo eventualmente registrada em nome do agressor.

Lei 13.882/2019 (PL 1619/2019) - Concede prioridade de matrícula a filhos de mulher que sofre violência doméstica.

Lei 13.894/2019 (PL 510/2019) - Garante às vítimas de violência assistência judiciária para pedido de divórcio, separação, anulação de casamento ou dissolução de união estável.

Lei 13.984/2020 (PL 5001/2016) - Prevê o comparecimento do agressor a programas de recuperação e reeducação.

Lei 14.188/2021 (PL 741/2021) - Torna o risco à integridade psicológica da mulher um dos motivos para o juiz afastar imediatamente o agressor do local de convivência com a ofendida.

Lei 14.310/2022 (PL 976/2019) - Determina o registro imediato pelo juiz das medidas protetivas de urgência deferidas em favor da mulher.

Lei 14.550/2023 (PL 1604/2022) - Determina a concessão sumária de medidas protetivas de urgência às mulheres a partir da denúncia de violência.

Lei 14.674/2023 (PL 4875/2020) - Prevê a concessão de auxílio-aluguel a mulheres vítimas de violência doméstica.

Lei 14.887/2024 (PL 2737/2019) - Determina que a mulher vítima de violência tenha atendimento prioritário para a cirurgia plástica reparadora.

Quem foi Maria da Penha?

Farmacêutica bioquímica e natural do Ceará, Maria da Penha sofreu constantes agressões por parte do marido. No ano de 1983, o esposo tentou matá-la com um tiro de espingarda. Maria escapou da morte, mas ficou paraplégica. Há época, o professor colombiano Marco Antônio Heredia Viveiros, marido de Maria, disse que ambos foram vítimas de assalto. Quando voltou para casa, após a internação e tratamentos, sofreu uma nova tentativa de assassinato. Dessa vez, o marido tentou eletrocutá-la. 

Na década de 80, quando os crimes ocorreram, não houve punição. No entanto, Maria da Penha denunciou a segunda agressão ao Ministério Público Estadual, mas o julgamento só aconteceu em 1991, oito anos após a denúncia. No primeiro julgamento Marco Antonio conseguiu anular o processo, mas cinco anos depois ele foi condenado a dez anos de prisão. 

Com o processo ainda correndo na Justiça, em 1994, Maria da Penha lançou o livro “Sobrevivi… posso contar”, que  narra as violências sofridas por ela e pelas três filhas.

Com o apoio vindo após a divulgação do livro, Maria acionou o Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) e o Comitê Latino Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM). Estes órgãos encaminharam seu caso para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), em 1998.

Assim, em 2002, o caso foi solucionado e o Estado brasileiro foi condenado por omissão e negligência pela Corte Interamericana de Direitos Humanos. Portanto, o Brasil teve que assumir o compromisso de reformular as leis e políticas em relação à violência doméstica. 

Uma vida sem violência é um direito das mulheres.

 

Publicado em 09 de agosto de 2024

Fonte: Agência da Câmara dos Deputados e do Senado Federal
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