Para não esquecer: Anísio Teixeira e sua história com a Universidade de Brasília

Um suposto acidente em tempos de ditadura militar marcaram sua morte

Há 52 anos o Brasil perdia um dos ícones da educação brasileira. Educador, escritor e jurista, Anísio Teixeira ficou conhecido por defender uma educação pública, gratuita e laica. Sua história se mistura não apenas com a construção de uma educação que deveria ser um direito de todas por meio de projetos na gestão pública da educação, mas também com a construção da Universidade de Brasília (UnB). Nesta série de publicações sobre a ditadura militar, a Associação dos Docentes da Universidade de Brasília - Seção Sindical do ANDES-SN (ADUnB-S.Sind.) relembra a trajetória desse professor, nascido no interior da Bahia, em Caetité, que teve sua vida ceifada aos 70 anos de idade, no que foi relatado à época como um acidente. 

Anísio Spínola Teixeira, nasceu no dia 12 de julho de 1900. Filho de uma família de influência na região e com boa condição financeira, Anísio estudou em bons colégios, tanto em Caetité, quanto na capital baiana, Salvador.  Formou-se em Direito pela Faculdade de Direito do Rio de Janeiro, em 1922.

Em 1924, Anísio Teixeira começou a trabalhar com educação. O início dessa trajetória se deu quando ele foi nomeado por Francisco Marques de Góes Calmon, governador da Bahia, para ser inspetor-geral de ensino. A partir daí, o educador foi construindo sua carreira como um dos maiores nomes da educação. Anísio fez parte do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, formulado em 1932 com a proposta de reformulação da educação no Brasil e defendia  uma escola pública e laica que não permitisse que o acesso à educação fosse visto como um privilégio, mas sim como um direito de todo cidadão brasileiro. 

Também atuou em diversos cargos públicos como chefe da Secretaria de Educação da Bahia e Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal de Nível Superior (Capes), e no Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (Inep). 

Em Brasília, o conceito de Escola Classe como um espaço de educação integral foi um dos legados de Anísio. A concepção de educação de qualidade e acessível a todos, sem que haja distinções de classes sociais, permanece como uma das marcas dele para a educação no Brasil. Ainda hoje, todos os educadores brasileiros consideram esses valores muito relevantes. 

Em 1961, Anísio foi nomeado por Juscelino Kubistchek, para que organizasse o plano educacional de Brasília. Esse projeto envolvia não só a Universidade, como também toda a estrutura da educação da nova capital. Na instauração da UnB, era um dos principais conselheiros de Darcy Ribeiro. Os dois foram grandes parceiros nesta estruturação. Para Darcy, Anísio Teixeira era o educador mais brilhante do Brasil. “Conheci muita gente inteligente e cintilante, mas Anísio foi o mais. Conhecia educação com muita profundidade e foi um homem que refez o seu próprio pensamento várias vezes na vida”, disse ele. 

A UnB foi o maior projeto da intelectualidade brasileira, e Anísio previu e pôde realizar isso, sendo, inclusive, reitor da UnB de junho de 1963 a abril de 1964. Mas foi afastado da reitoria logo no início da Ditadura Militar e aposentado compulsoriamente do serviço público. Este afastamento ocorreu após a invasão da Universidade, em que estudantes e professores foram surpreendidos por tropas do exército e policiais de Minas Gerais. Os militares chegaram em 14 ônibus, com três ambulâncias já preparadas para possíveis confrontos. No campus, invadiam salas de aula, revistavam estudantes, procuravam armas e material de propaganda subversiva. Buscavam também 12 professores que deveriam ser presos e interrogados. A biblioteca e os escritórios dos professores ficaram interditados por duas semanas. 

Entre 1964 e 1966, Anísio Teixeira esteve exilado do país, residindo nos Estados Unidos. Neste período, lecionou na Universidade de Columbia, em Nova York, onde havia  estudado na década de 1920, atuou como professor visitante nas universidades de Nova York e da Califórnia. De volta ao Brasil, colaborou com o projeto da Fundação Getúlio Vargas para criação de um Instituto de Estudos Avançados em Educação.

Mas em 11 de março de 1971, após uma palestra na FGV, o professor almoçaria com Aurélio Buarque de Holanda com o objetivo de obter o voto do famoso lexicógrafo para que fosse aceito na Academia Brasileira de Letras. Anísio nunca apareceu neste almoço. Dois dias depois, seu corpo foi encontrado no fosso do elevador do prédio em que Aurélio Buarque morava. Alegou-se, na época, que a causa da morte tinha sido um acidente.

Entretanto, investigações realizadas pela Comissão Nacional da Verdade descobriram indícios de que o educador teria sido preso por agentes da ditadura e levado para a Aeronáutica. Existe a possibilidade de que ele tenha sido torturado e morto nos porões da ditadura e a causa de sua morte tenha sido forjada. Apesar das suspeitas, a Comissão não comprovou se de fato ele fora vítima da ditadura.

Para que não se esqueça, para que nunca mais aconteça, relembramos nesta semana tão importante para nosso país, a memória deste grande educador que fez parte da história de nossa Universidade de Brasília. 

Comissão Anísio Teixeira de Memória e Verdade da Universidade de Brasília

E quem também não nos deixa esquecer sobre ele, é a Comissão Anísio Teixeira de Memória e Verdade da Universidade de Brasília (CATMV/UnB), criada em agosto de 2012 por meio da Resolução da Reitoria nº 85/2012.

O grupo, formado por professores e ex-estudantes da UnB, foi instituído no contexto de criação de comissões estaduais e setoriais, que se seguiram à instituição da Comissão Nacional da Verdade (CNV), estimulando o processo da justiça de transição no Brasil.

Entre agosto de 2012 e abril de 2015, a Comissão Anísio Teixeira investigou violações de direitos humanos e liberdades individuais ocorridas entre 1º de abril de 1964, data do golpe militar e que se seguiu de imediata intervenção de tropas na universidade, até 5 de outubro de 1988, dia de promulgação da Constituição democrática brasileira.

Durante mais de dois anos e meio, a CATMV colheu depoimentos de docentes e estudantes perseguidos, analisou extensa documentação do Arquivo Nacional e de outros acervos e realizou audiências públicas.

Entre os casos emblemáticos analisados pela Comissão, estão o de Anísio Teixeira, reitor da UnB afastado do cargo pelos militares e morto em 1971 em circunstâncias cuja elucidação policial têm sido questionada, e os desaparecimentos de Honestino Monteiro Guimarães, Paulo de Tarso Celestino da Silva e Ieda Santos Delgado.

Confira aqui o Relatório publicado pela Comissão em 2016.

 

Publicado em 30 de março de 2023

Publicado em 30 de março de 2023

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