A mentira como instrumento da arrogância oligofrênica do Ministro Weintraub
Por Cláudio Lorenzo - Professor Adjunto do Departamento de Saúde Coletiva da UnB e secretário-geral da ADUnB.
Um ministro de Educação é um ator político de função executiva responsável pela gestão de todo o sistema educacional, desde a socialização e alfabetização infantil até à formação profissional e a capacitação de docentes para a pesquisa com vistas ao desenvolvimento científico e tecnológico do país. Ou seja, seu cargo está diretamente relacionado às ações que garantem o compartilhamento e a produção do conhecimento.
Assim sendo, mesmo na recente e oscilante história da vida democrática do país, onde majoritariamente o poder executivo tem sido ocupado por políticos conservadores, e mesmo ainda nos tristes períodos de ditadura, os ocupantes desta pasta, vinham sendo escolhidos por apresentarem algum grau mínimo de respeitabilidade intelectual. Mas esse momento peculiar e exótico ao qual o trem da história trouxe o Brasil, tem nos proporcionado um circo de horrores que nos constrange como brasileiros no exterior e nos envergonha como cidadãos em nosso próprio solo. O Ministro Weintraub, com sua rasa intelectualidade forjada nos cursos de curta duração do mercado, a qual não lhe permite um mínimo debate com a inteligência nacional de qualquer tendência política, serve mais como produtor de digressões risíveis, como um bobo da corte que nos desvia a atenção, para que os verdadeiros artífices ultraliberais no poder, elaborem com tranquilidade os projetos de destruição do ensino público e da soberania nacional em ciência e tecnologia nas coxias da corte, a exemplo do Future-se e da dissolução do CNPq.
Os professores universitários brasileiros já viram o Ministro dançando sob um guarda chuva enquanto anunciava cortes na educação, depois apresentando uma patética tentativa de demonstrar cálculos de proporção cometendo erros crassos em operações matemáticas simples, em seguida, ofendendo a categoria pela alcunha de zebras gordas, cuja a fome de fera predatória desse governo pretende devorar. E agora, entre indignados e incrédulos, o vimos em sua poltrona de couro, com a postura corporal arrogante de sempre, envelopada em paletó de corte caro, atacar a autonomia universitária, uma conquista secular responsável em grande parte pela revolução científica e pelo fim da idade média.
Em seu olhar podemos perscrutar o gozo oligofrênico do exercício de um poder desmerecido, pelo qual antevia feliz os efeitos de declarações que fariam sua mediocridade, mais uma vez, célebre nas redes. E é com esse olhar que ele chama as Universidades Federais de “ Madraças de Doutrinação”, aqui já aproveitando para destilar seu preconceito ao referir-se às escolas religiosas muçulmanas. O seu conceito de doutrinação, só faz sentido no contexto hermenêutico particular dessa confraria de extremistas de direita, neofascista e milicianos que formam seu governo. A universidade é a instituição mais importante que uma sociedade dispõe para se opor às práticas doutrinadoras, uma vez que, por definição, é o espaço do universo de saber, do livre pensar, da crítica de costumes e poderes instituídos, onde todas as ideias circulam e podem ser debatidas, aceitas ou refutadas. Doutrinação é o ato de incutir valores que obrigatoriamente devem ser seguidos, e isso, quem tenta fazer é o governo que esse ministro representa, ao buscar estabelecer o que se pode e o que não se estudar ou dizer em sala de aula.
Mas, o elemento mais surpreende de sua última declaração sobre as Universidades Federais é a afirmação de nelas existem grandes plantações de maconha e que os laboratórios de química produzem em quantidade drogas sintéticas, entre as quais anfetaminas. A Mentira é enunciada, como esperado, sem apresentação de qualquer evidência, sem precisar sua localização e sem qualquer referência sobre onde ele obteve essa informação, o que constitui, entre outros deslizes, um crime de responsabilidade.
Não fosse o fato de sabermos que esse governo se elegeu e mantém ainda seus 30 % de apoio popular com base na produção de mentiras, revestidas em simulacros de verdade, e poderíamos legitimamente suspeitar do acometimento de um transtorno mental agudo. O mais curioso ainda é o fato dele afirmar que são borrifados agrotóxicos diariamente nas grandes plantações de maconha, artifício retórico com o qual posteriormente atribui alto valor tecnológico aos agrotóxicos, e insinua que o combate ao uso dele por parte dos docentes e pesquisadores universitários, quando denunciam os prejuízos ao ambiente e à saúde humana, é apenas fruto de uma ideologia contrária ao agronegócio. Reduzindo-se o episódio à essência, o que temos é um ministro de educação mais preocupado com o sucesso do agronegócio que com a educação do povo brasileiro.
Ou seja, apesar de todas as evidências da importância e do reconhecimento internacional da produção científica brasileira, sendo mais de 90% realizada nas universidades federais e a despeito também do excelente ranqueamento internacional de muitas dessas universidades, o que o ministro de educação brasileira vai a público fazer, é produzir mentiras difamatórias que faltam com o decoro mínimo exigido para o cargo.
Já não é possível, mesmo para esse império de incultos, mesmo para essa dinastia de brutos que acedeu ao poder central do país, manter esse ministro no cargo. O desenlace do caso nos dirá muito sobre o grau de higidez das nossas instituições democráticas.
Cláudio Lorenzo é professor Adjunto do Departamento de Saúde Coletiva da UnB,
Membro do Conselho Assessor da Rede Bioética da UNESCO para América Latina e Caribe e
Secretário Geral da Associação de Docentes da Universidade de Brasília – Seção Sindical ANDES.
Publicado em 23 de novembro de 2019