Inconstitucional, decreto de Bolsonaro precariza a previdência
Veja como foi a live sobre o Decreto 10.620/21, que muda a gestão da previdência dos servidores públicos para o INSS.
O Decreto 10.620/21, publicado em fevereiro pelo presidente Bolsonaro, faz parte do desmonte dos serviços públicos e retirada de direitos dos trabalhadores do setor. Essa é a opinião dos participantes da live realizada pela ADUnB Seção Sindical nesta quinta (29/4). Inconstitucional, o decreto que muda a gestão da previdência dos servidores públicos para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) está em vigor, mas precisa ainda de normatização. Dessa forma, por enquanto, o atendimento da previdência segue como antes.
"Precisamos promover o fim dessa falsa dualidade que o governo vende de que o servidor público é inimigo da população e das demais categorias. Esse decreto vai causar prejuízos na aposentadoria de todos, não só ao servidor público", destacou a diretora da ADUnB, Eliene Novaes. Para ela, a ação contra a gestão da previdência dos servidores é mais uma tentativa de colocar o Estado Social refém da iniciativa privada.
Convidado da live, o diretor do ANDES Sindicato Nacional, Amauri Fragoso de Medeiros, destacou que a retirada de direitos dos servidores públicos e, em especial, dos docentes é um processo histórico “ligado às estruturas de quem domina o país, que associa um estado cada vez menos social e com a retirada de direitos da classe trabalhadora. E os professores não poderiam escapar disso”, afirmou. O docente destacou a importância da unidade de luta dos trabalhadores em defesa dos serviços públicos.
O decreto é objeto de ação de inconstitucionalidade no STF
O Decreto 10.620/21 transferiu a gestão da concessão e manutenção das aposentadorias e pensões do Regime Próprio dos Servidores Públicos Federais (RPPS) para o INSS.
Ele é objeto da Ação Direta de Inconstitucionalidade 6767, de autoria do Partido dos Trabalhadores (PT), ingressada no Supremo Tribunal Federal. O ANDES SN e outros sindicatos entraram com pedido de Amicus Curiae no processo da ADI, no intuito de fortalecer e reforçar, com argumentos, a inconstitucionalidade do decreto. Além disso, o Sindicato Nacional se prepara para entrar com uma ação civil pública, caso seja necessário.
O advogado e assessor jurídico da ADUnB, Leandro Madureira, explicou que o Decreto é inconstitucional por corromper a Emenda Constitucional 103/2019, que veda a existência de mais de um regime próprio de previdência social para os servidores titulares de cargos efetivos e de mais de uma unidade gestora do respectivo regime em cada ente estatal. “Quando o decreto determina que os servidores públicos terão seus recursos geridos pelo INSS, ele acaba criando duas entidades para a gestão dessas aposentadorias e pensões. Isso contraria diretamente o texto da EC 103”, explica.
Além disso, e não menos importante, Madureira explicou que Bolsonaro promoveu a inconstitucionalidade ao utilizar um decreto para regulamentar um tema que, por sua natureza, deveria ser normatizado unicamente por meio de Lei Complementar. Dessa forma, a matéria deveria ter sido avaliada e votada pelo Congresso Nacional.
“É necessário que se fale sobre esse combate e que o decreto seja considerado inconstitucional. É necessário que o servidor se atente aos riscos - quando há uma edição de um decreto presidencial sem qualquer discussão no legislativo - e dos seus efeitos, através de uma canetada”, disse o jurista, destacando que o governo Bolsonaro se utiliza de medidas provisórias e decretos para governar. “Isso é extremamente preocupante hoje. Neste cenário caótico, nosso país tem sido submetido a essa inconstitucionalidade que prejudica a todos”.
O atendimento da previdência ainda não mudou
Atualmente, todo o atendimento relacionado à previdência dos servidores públicos ainda não está sendo gerido pelo INSS. Isso porque, para além do debate da inconstitucionalidade, o decreto precisa ser normatizado. “Como todo decreto, ele não tem efeito imediato até a regulamentação dos atos complementares e da reestruturação de pessoal prevista para a centralização. Atualmente os docentes ainda estão sendo atendidos pela Universidade”, exemplificou o jurista.
Os servidores públicos possuem, hoje, suas aposentadorias e pensões regidas por cada órgão ou departamento de recursos humanos da entidade aos quais são vinculados. No caso dos(as) docentes da Universidade de Brasília(UnB), essa gestão fica a cargo do Decanato de Gestão de Pessoas – DGP, que presta contas ao Ministério da Economia, que é o órgão final que possui a centralização do SIPEC – Sistema de Pessoal Civil da Administração Federal. O INSS se ocupava somente da gestão dos benefícios previdenciários dos trabalhadores da iniciativa privada ou dos servidores detentores de cargos provisórios (professores substitutos ou ocupantes exclusivos de cargos em comissão).
O que pode mudar, caso o Decreto seja declarado constitucional
O advogado da ADUnB explicou que a mudança não implica que os servidores públicos estarão sujeitos às regras do Regime Geral da Previdência Social (RGPS) e que estão mantidas as regras do Regime Próprio dos Servidores Públicos Federais. “Esse decreto transfere a gestão do regime próprio para o INSS, mas não transfere as regras. Continuamos tendo as regras específicas do servidor público e, em separado, as regras do (setor) privado”.
Caso seja regulamentado o decreto, os servidores públicos serão atendidos pelo INSS na gestão de suas aposentadorias e pensões. “Isso significa que teremos uma piora significativa do serviço prestado. Significa o ingresso de milhões de clientes novos no INSS, um órgão que já está sucateado e que não está dando conta, hoje, de suas atribuições”. Para ele, transferir gestão para o INSS significa aumentar a precarização do serviço e piorar um atendimento que já é ruim para todos os cidadãos, não somente para os servidores públicos.
Inofensivo?
O assessor destaca que o decreto não é “inofensivo” e é extremamente preocupante, pois as movimentações indicam o aceleramento do processo de unificação dos regimes de previdência em uma única estrutura, inclusive para facilitar a privatização dos serviços previdenciários. “O decreto vem na linha histórica de sucateamento do serviço público e da aposentadoria na tentativa de aproximação dos regimes do servidor público e privado”, disse, destacando que a ideia já vem sendo gestada desde a Reforma da Previdência.
Leia a nota técnica sobre o Decreto, divulgada na Circular 053/21 do ANDES-SN.
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Publicado em 30 de abril de 2021